terça-feira, 15 de maio de 2018

Origens da Islamofobia 03: As Cruzadas



Terceiro e último vídeo da série Origens da Islamofobia!

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“Maomé: uma biografia do Profeta” (ARMSTRONG, Karen)
“História das guerras” (MAGNOLI, Demétrio (org.))

“Guerra santa: formação da ideia de cruzada no Ocidente cristão” (FLORI, Jean)

“Os três dedos de Adão: ensaios de mitologia medieval” (FRANCO JÚNIOR, Hilário)

“Viajar en la Edad Media” (DUARTE, José Ignacio de la Iglesia (org.))



Origens da Islamofobia 03: As Cruzadas


Por Thiago Damasceno

As salamu alaikum!
Agora vamos abordar, de forma introdutória, as Cruzadas. Posteriormente, farei um texto mais aprofundado sobre o tema. Então, o que foram as Cruzadas?
Enquanto o Islã crescia religiosa, cultural, política e territorialmente, os reinos europeus ocidentais estavam divididos e enfraquecidos. Karen Armstrong (2002) até fala que o Islã era a potência na época. No entanto, podemos questionar essa ideia de “potência”. Claro que o Islã tinha grande poder no período medieval, mas lembro que seu território e suas jurisdições políticas não estavam unificadas e unidas, mas divididas nas formas de vários califados. Mas chegou um momento em que as coisas começaram a mudar para os reinos europeus ocidentais. Vallejo (2009) situa essas mudanças entre os séculos XI e XIII.  
O que aconteceu com a Europa nesse período? De forma geral, climas melhores favoreceram mais colheitas e mais alimentos para uma população que já estava crescendo muito. Também houve desenvolvimento técnico na construção de edificações, estradas e demais itens que permitiram um progresso material e o crescimento da importância política das cidades. Ou seja, a Europa ocidental estava em condições de se expandir, entre os séculos X e XIII, diferente da sua situação anterior de invasões e enfraquecimento político dos senhores feudais. Nesse período surgiram as Cruzadas.
Para a professora Fátima Regina Fernandes (2006), as Cruzadas foram um movimento surgido no Ocidente e que levou a um longo enfrentamento militar principalmente nas regiões das atuais Síria e Palestina, entre os séculos XI e XIII, e na Península Ibérica entre os séculos VIII e XV.
Já para o historiador francês Jean Flori (2013), que analisou as relações entre o conceito de “guerra santa” e as Cruzadas, estas foram uma guerra santa cujo objetivo era a libertação de Jerusalém. A análise de Flori leva em conta o aumento o crescimento das peregrinações cristãs ao Santo Sepulcro de Cristo em Jerusalém desde o final do século XI, por isso a importância da cidade santa em sua leitura sobre as Cruzadas. Para esse autor, a Europa ocidental modificou totalmente sua situação depois do ano mil, passando de “cidadela sitiada” para uma região em expansão.
As mudanças na Europa ocidental incentivaram a convocação para a Primeira Cruzada (1095-1099) pelo papa Urbano II (1042-1099) no Concílio de Clermont em Clermont Ferrand, na França, em 25 de novembro de 1095. A convocação papal aos cristãos para lutar contra os “infiéis” muçulmanos no Oriente a fim de libertar o Santo Sepulcro de Cristo foi a resposta do pontífice ao pedido de auxílio do imperador bizantino Aleixo I (1056-1118), cujos territórios na Ásia Menor estavam prestes a ser invadidos pelos turcos seljúcidas.  
Entendido brevemente o que foram as Cruzadas, já podemos relacionar tudo o que vimos até agora para entendermos o nascimento da islamofobia.
Karen Armstrong (2002) destaca que antes das Cruzadas não havia muito interesse dos europeus em relação ao Profeta Muḥammad e sua religião. Isso mudou com as Cruzadas. Se encararmos as Cruzadas como um momento de expansão da cristandade ocidental rumo ao Oriente, vemos que os cristãos então se depararam com um poder político islâmico forte, fosse ele árabe ou turco. Por volta de 1120 os europeus, no geral, já sabiam quem era Muḥammad e o Islã, mas claro, de forma bem estereotipada e equivocada, se baseando muito no Mito de Mahound. Nesse mesmo período, século XII, se desenvolveram mitos no Ocidente, como o mito de Carlos Magno, do Rei Arthur, de Robin Hood e, claro, o Mito de Mahound, que caía bem em um contexto histórico onde cristianismo e Islã eram, geralmente, inimigos militares e políticos. Em um contexto de guerra, não se fala bem do inimigo, certo? Mas lembro que as Cruzadas não podem ser resumidas apenas a guerras. Houve momentos de trégua, quando cristãos e muçulmanos fizeram trocas culturais.
Armstrong (2002) então afirma que o mito de Mahound como inimigo e sombra da cristandade estava arraigado no imaginário europeu ocidental. Vamos entender, por enquanto, imaginário de forma breve, como um conjunto ou sistema de imagens visuais, mentais, textuais e concretas que compõem determinado acervo ou coleção mental e conceitual de uma sociedade. Com o mito de Mahound e as Cruzadas, um componente do imaginário ocidental que foi gerado e permanece, até hoje, é a imagem do muçulmano como violento e amante da guerra, do assassinato e de tudo que é ruim. Podemos perceber aí um indício e início de islamofobia.  “O período das cruzadas, quando se estabeleceu a figura fictícia de Mahound, foi também uma época de muita tensão e negação na Europa. Isso é claramente expressado pela fobia contra o islã”. (ARMSTRONG, 2002: 35).
Como essa autora também afirma, o mito de Mahound diz muito mais sobre quem o produziu. Relatos da vida do Profeta como um libertino sexual falam mais sobrea a repressão sexual que os cristãos medievais viviam. O estigma do Islã como “religião da espada”, criado durante as Cruzadas, reflete as ansiedades cristãs sobre sua identidade, como a preocupação oculta sobre a relação conflituosa entre a religiosidade agressiva dos cruzados e a mensagem pacifista de Jesus Cristo.
Em suma, destaquei fenômenos históricos muito antigos que influenciaram no surgimento da islamofobia, um problema que não é de hoje, mas que de forma nenhuma precisa ser reproduzido. Espero que a historização da islamofobia contribua para o repúdio e combate ao problema.
As salamu alaikum e até a próxima!